Meu pai é um herói

 

SINOPSE

Sou uma Kethlin cheia de sentimentos. Quem me conhece sabe que sinto muito, me importo muito, sorrio muito, mas também sou chorona.

“Meu pai é um herói” traz uma mistura de histórias que criei, mas também de coisas que eu vivi. Apenas quem me acompanha desde a infância vai conseguir descobrir ao longo das páginas deste livro o que é real e o que é imaginário.

O livro é uma forma de homenagear meu pai e registrar fisicamente o amor que sinto por ele, que não está mais aqui. Mas não pense que a intenção do livro é contar um pouco da minha história de vida. Não é essa a minha intenção. O que busco é fazer com que as pessoas passem a refletir um pouco mais sobre o real sentido de sua existência e sobre o que verdadeiramente importa.

Através de uma narrativa em primeira pessoa, o livro conta a história de um garotinho muito humilde que, desde os primeiros anos de vida, acompanhou a luta dos pais. Embora todos os capítulos envolvam os mesmos personagens, cada um traz uma história independente.

Apesar da pouca idade, da inocência para enxergar a maldade no mundo, Antônio tinha uma visão de adulto sobre algumas coisas que aconteciam, enquanto em outras situações, não deixava de lado os seus “pensamentos de criança”.

Que esse livro possa lhe inspirar e lhe tornar uma pessoa ainda mais humana! Que ele possa tocar seu coração, clarear seus pensamentos e lhe emocionar, assim como me emocionei em muitas páginas que eu escrevi!

Perdi meu pai aos 20 anos, em um assalto que eu mesma presenciei em Santa Cruz do Sul. O vi caído no chão, baleado, após um latrocínio (roubo seguido de morte). Mas eu aprendi tanto, mas tanto com esse homem, que não poderia ter esses ensinamentos só para mim.

Muito antes de ele falecer, eu já havia começado a escrever um livro justamente com o nome: “Meu pai é um herói”. Coincidência ou não, eu só sei que ele será para sempre o meu herói sem capa!

Uma boa leitura para você e que depois de finalizar este livro, eu tenha contribuído, de alguma forma, através das minhas palavras, para que você seja um ser humano ainda melhor!

Inspirações, um chalé e o desemprego

 

Se hoje paro e penso no quanto a vida de adulto é desafiadora, me pergunto se sempre foi assim ou se era eu que na infância não enxergava isso – o que é o mais provável.

Cresci em uma família muito simples, sem frescura. Apesar de ouvir meus pais falando sobre dificuldades, na minha infância parecia tudo tão fácil. Ou eles que faziam tudo ficar fácil.  Acho que eu nem me dava conta do quanto meus pais passavam trabalho. Sou filho único e não por isso fui mimado. Aprendi a valorizar cada conquista e cada pessoa que pelo meu caminho passava.

Aliás, por falar em valorização, meu pai e minha mãe sempre foram minhas inspirações. Se olho para trás, lembro de muitos momentos que contribuíram, de alguma forma, para eu me tornar o que hoje eu sou.

Em um chalé, em uma cidadezinha de São Paulo, morávamos eu, minha mãe Joana e meu pai José – que nasceu no Rio Grande do Sul, mas, logo nos primeiros anos de vida, foi morar em São Paulo. Com a maturidade que tenho hoje, eu sei que a casa havia sido construída com algumas madeiras velhas e erguida através de muito suor e criatividade do meu pai. Sob o meu olhar de criança, ele era o melhor arquiteto e engenheiro que poderia existir. Pintada com uma tinta na cor amarelo claro, aquele chalé foi onde sonhei muito e também pensei muito sobre a vida.

Minha mãe Joana sempre foi uma grande mulher, apesar da baixa estatura. Com os cabelos curtos, olhar doce, coração grandioso, ela é muito preocupada com as pessoas. Meu pai, ah, meu pai, esse sempre encantou pelo sorriso largo, simpatia e criatividade.

Mesmo quando ainda menino, eu comecei cedo a entender um pouco mais sobre a vida em comparação às outras crianças da minha idade. Lembro até hoje da preocupação dos meus pais ao abrirem a geladeira e verem que ela estava praticamente vazia. Nunca passei fome, mas sei que eles deixavam, muitas vezes, de comer para que tivesse comida para mim. Meu pai trabalhou em grandes empresas da cidade e até mesmo em outro estado. Cresceu muito como profissional, mas também se decepcionou com o mercado de trabalho e ficou um bom período desempregado. Quando isso aconteceu, era minha mãe Joana que sustentava a casa. Foram tempos mais difíceis, mas isso passou, assim como tudo na vida passa.

Eu não entendia, com seis, sete anos, o que era desemprego. Na verdade, achava um máximo meu pai comigo em casa brincando e me dando atenção. Sempre muito questionador, eu perguntava para ele como se fazia várias coisas e ele sempre tinha a resposta na ponta da língua. “Nossa, ele é uma das pessoas mais inteligentes do mundo” – era o que eu pensava.

Passaram alguns meses e até que um certo dia o sol brilhou outra vez para o meu pai e ele voltou a trabalhar. Como havia feito alguns cursos, conseguiu fazer alguns “bicos” como torneiro mecânico. Mesmo assim não era uma renda fixa e o valor ainda era baixo. Minha mãe também não ganhava muito. Só que meu pai sempre dizia que com essa profissão ele conseguia montar grandes estruturas e ajudava a construir sonhos. Uau, eu achava isso incrível.

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Ass.: Papai

 

Em uma noite fria de inverno, lembro quando eu estava sentado na sala e ouvi meus pais reclamando sobre a falta de dinheiro. Na minha cabeça de criança não entendia, também, como um papel, que é o dinheiro, pudesse valer tanto e ser essencial para uma família.

Me aproximei com o intuito de entender mais o que se passava nos corações das duas maiores inspirações da minha vida. Meu pai, com aquele jeito brincalhão dele, me olhou, abriu um sorriso e um pouco aflito disse:

– Antônio, meu filho, pegue teu caminhãozinho e vá para o quarto brincar. Depois te darei um beijo de boa noite. Agora eu e tua mãe precisamos conversar.

Fiz que sim com a cabeça e, antes de sair dali, abri a geladeira, pois estava com fome. Encontrei apenas um pão duro que a mãe havia comprado fazia cinco dias. Como a margarina havia terminado, optei por não comer nada. Me retirei. Naquele momento senti algo ruim, sem mesmo entender o que se passava.

Resolvi sentar na cama, peguei meu travesseiro e o abracei apertado. Através do vidro da janela, observei as estrelas e viajando pelos meus pensamentos lembrei do que tantas pessoas haviam me falado sobre elas. Embora cada uma delas fosse alguém importante que partiu, eu também fazia analogia aos meus sonhos. Queria que os meus sonhos fossem como estrelas. Mesmo distantes de se concretizarem, deveriam sempre brilhar, principalmente dentro do meu coração. Com o sono se aproximando, deitei minha cabeça no travesseiro e comecei a agradecer, pois é o que sempre fui ensinado a fazer. Agradeci pela vida, pelos meus pais, pela saúde e pelos meus amigos. Peguei rapidamente no sono em meio àquele momento que era apenas meu e de Deus.

Dormi ferrado no sono e acordei com a minha mãe dizendo:

– Vamos Antônio, se arrume para ir à escola. Está na hora.

Abri rapidamente os olhos, esfreguei eles com os dedos e olhei diretamente para a cômoda do meu quarto. Lá estava um quadrinho com algumas coisas escritas. A letra era do meu pai. Como estava aprendendo a ler, tive um pouco de dificuldade pra entender, mas lá estava escrito: “Eu te amo. Tenha um ótimo dia. Ass.: papai.”

Adorava quando ele escrevia “Assinado”. Foi a primeira palavra mais diferente que eu aprendi a ler. Aliás, fiquei tão feliz em ler isso. Essas mensagens começaram a ser frequentes sempre que meu pai iria fazer os “bicos” dele como torneiro mecânico.

 

Comprometimento e responsabilidade

 

Às vezes, eu me achava um garoto diferente para minha idade. Enquanto muitos amiguinhos e coleguinhas deixavam os estudos de lado em casa para jogar videogame, eu ficava em casa, no meu quartinho, fazendo o que a profe pedia.

Sentia uma enorme vontade de ir jogar bola, de assistir televisão, mas algo era mais forte que eu e me fazia ficar fazendo os temas da escola. Minha mãe dizia que isso se chamava comprometimento e responsabilidade. Na verdade, aos meus seis anos, eu não entendia muito o que era isso.

Quando era questionado sobre o que iria fazer em uma tarde linda de sol, eu respondia que iria fazer as tais responsabilidades da escola. E querendo ou não, isso sempre fazia muito sentido para mim.

Sempre ciente dos meus compromissos da escola, acabei me acostumando com as tarefas e não precisava mais que meus pais ficassem monitorando o que eu estava fazendo. Em alguns momentos, até perguntava a mim mesmo se o que eu estava fazendo era o certo, já que a maioria das crianças da minha idade preferia brincar em vez de se dedicar aos estudos. Hoje, com a minha cabeça de adulto, eu sei que eu havia tomado uma das melhores decisões da minha vida.

Aliás, por falar em tempo de escola, alguns acontecimentos me marcam até os dias de hoje. Já que meu pai saía muito cedo para ir trabalhar, era minha mãe que me levava à escola antes de ir trabalhar a uma hora da tarde. Como ela não sabia dirigir, íamos sempre a pé. Para mim isso era ótimo. Aliás, achava um máximo fazer um “passeio” com a minha mãe. Mas ainda sem saber olhar as horas direito, não entendia por que no horário em que eu chegava ainda não havia ninguém na escola. Mais tarde fui entender que isso acontecia, porque ela era obrigada a me deixar meio-dia na frente da escola para que não se atrasasse para o trabalho.  Hoje também sei que minha mãe ficava com o coração aflito por deixar uma criança de seis anos sozinha em frente a uma escola. Ela me abraçava apertado, me dava um beijo e, com um olhar amoroso, me dizia: “Antônio, tu não dá conversa para estranhos. Não pega carona com ninguém. Logo teus coleguinhas virão”.

Mas eu sabia, pelas outras experiências que tive, que eles não viriam tão logo assim. Eu me achava “gente grande” e ficava ali, pensando qual chiclete eu iria comprar com os 50 centavos que eu tinha na mochila e que, na época, era muito.

Para voltar para casa eu contava com a boa vontade e coração generoso da minha dinda do coração. Com uma moto biz, ela me buscava na escola e mais uma vez eu achava isso um máximo. Falando nisso, essa visão que uma criança tem sobre a vida de fato encanta. Elas conseguem fazer de algo tão simples uma grande conquista e de uma dificuldade, uma grande aventura.

 

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O acidente

 

Era no mercado mais próximo de casa que meu pai José e minha mãe Joana compravam as coisas para a casa. Sem dinheiro para pagar à vista, todo o gasto no mercado era colocado em um papelzinho. Os donos do estabelecimento confiavam na gente, o que era muito bom.

Fui me acostumando em ver meus pais pedindo para anotar os gastos. Mas também vi muitas e muitas vezes comentando entre eles: “A conta no mercado já está em quase R$ 500. Precisamos cortar os gastos”.

Depois de um tempo e após algumas economias, meu pai conseguiu comprar uma moto muito simples para a minha mãe. Na verdade, não era bem uma moto, mas era bom o suficiente para que ela pudesse se locomover para fazer as coisas simples do dia a dia.

Em um dia pela manhã – enquanto meu pai trabalhava e após eu ter lido mais uma vez no quadrinho “Eu te amo. Ass.: papai” – eu e a mãe fomos no mercado com aquela moto. Muito contente por poder dar uma volta e ir às compras com a minha mãe, coloquei o capacete e sentei no banco de trás. Abracei com muito carinho aquela cintura fininha. Com o vento soprando em nossa cara, conseguia até sentir o cheirinho da minha mãe.

Enquanto eu ficava feliz por poder comprar algumas coisinhas que eu gosto, mal eu sabia que minha mãe tinha a preocupação de que, em meio a uma situação financeira que já estava difícil, teria mais gastos. Hoje eu sei que essa realidade é também a de muitas outras pessoas que lutam diariamente para garantirem o sustento diário.

Em meio às prateleiras do supermercado, eu saía cumprimentando as pessoas e também os funcionários, que já me conheciam por estar com frequência ali. Na minha cabeça de criança, os donos do supermercado tinham uma vida incrível por terem à disposição tantas delícias. Não passava pelos meus pensamentos que tudo aquilo também tinha um custo para eles.

Como de moto tornava-se difícil levar todas aquelas compras, minha mãe pediu para que um dos funcionários do supermercado fizesse a entrega. Eu queria voltar com a minha mãe, abraçar aquela cintura fininha e sentir o cheirinho dela de novo. Mas ela fez questão de que eu voltasse de carro com o funcionário do supermercado. Você acredita em anjos? Bom, naquele momento acredito que tive um.

Minha mãe foi a primeira a deixar o local. Carregamos as compras e fomos logo atrás. O supermercado era pertinho de casa. No caminho, nos deparamos com um acidente. Passamos devagarinho pelo acidente e, em um primeiro momento, achei a cena forte, porque havia uma mulher deitada no chão, apenas balançando a cabeça. De repente, algo me chamou atenção: a cor da blusa da mulher. Era igual à blusa da minha mãe. Levei poucos segundos para entender        que aquela mulher deitada ali no chão era a minha mãe, minha pequena grande mulher. Rapidamente soltei um grito no carro e disse: “É a minha mãe!”.

O moço do supermercado apenas fez uma volta e me tirou do local, para que eu também não tivesse mais aquela visão. Voltei ao supermercado e fiquei por lá. Era perto do meio-dia e à tarde eu tinha aula. Como meu pai José estava na função da minha mãe, ele levou até mim a mochila e acabei almoçando com os proprietários do supermercado. Eu só estava com medo. Medo de que tivesse acontecido algo muito pior com uma das maiores inspirações da minha vida. Era difícil me imaginar sem os meus pais.

Dias depois soube que quando ela balançava a cabeça no local do acidente ela questionava: “onde está meu filho Antônio?”

Os dias passaram e minha mãe foi se recuperando, mas no hospital. Como ela bateu a cabeça, precisou de muito cuidado. A questão era delicada. Mas claro, eu não entendia nada disso. Quando pude vê-la no hospital, abri a porta e corri para perto dela. Fiquei pensando: como é bom ter os pais perto da gente!

 

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Se eu puder lhe dar conselhos…

Desde sempre fui sonhador e não acho que isso seja um problema. Uma das minhas frases é: os sonhos são o combustível da alma. E são mesmo. Quando temos sonhos, temos propósito, e quando temos propósito, entendemos o sentido da vida, temos motivação para continuar vivendo e lutando em um mundo tão difícil. Ao longo da minha trajetória, eu aprendi algumas coisas e penso que todos nós, de alguma forma, deveríamos compartilhar conhecimentos e vivências.

Gostaria de falar sobre conselhos. Eu poderia dar vários conselhos. E alguns deles seriam:

– Seja honesto e do bem. Tenho certeza de que você não vai se arrepender. A vida se encarrega de nos retribuir de alguma forma. Seja com conquistas, com pessoas boas ao nosso lado ou algum outro tipo de presente.

– Carregue contigo a humildade. Sempre acreditei que a humildade e simplicidade são alguns dos mais bonitos valores que um ser humano pode ter. Gente que é humilde e carrega simplicidade no coração brilha mais e traz mais pessoas para perto de si.

– Por mais que algumas situações lhe causem muito ódio e raiva, respire fundo. Chore o que precisar chorar e até mesmo grite ou xingue quando estiver sozinho (porque gente que não tem a ver com seus problemas não merece xingamentos). Mas depois disso, tente trabalhar em você mesmo esse sentimento para que ele não lhe consuma energia e não faça de você uma pessoa sem cor.

– Valorize todas as pessoas que tanto lhe ajudam e fazem coisas importantes para você. Valorize com abraços, com palavras, ofereça também o que você tem de melhor. Essas pessoas merecem!

– Não seja vingativo. Se alguém lhe fizer algo ruim, isso diz mais sobre essa pessoa do que sobre você. Se vingar mostrará alguém que você não é. Não é necessário se rebaixar ao mesmo nível de quem o feriu.

– Reclame menos e reconheça mais. Em alguns momentos, existem pessoas que fazem algo por nós e nem sempre é do nosso jeito e do jeito que gostaríamos. Talvez aquilo seja o que, naquele momento e situação, a pessoa tem de melhor a oferecer. Por exemplo, em vez de reclamar do gosto do café passado oferecido pela empresa em que você trabalha, quem sabe você agradece por estar em uma empresa que lhe oferece café e que designa uma pessoa para que, logo cedinho, deixe um café passado aos funcionários?

– Pratique a fofoca inversa. Que tal em vez de falar tão mal das atitudes das pessoas que você conhece, comece a falar sobre o que elas têm de bom? Por mais que uma pessoa possa ter infinitos defeitos, ninguém tira de mim a ideia de que alguma coisa boa ela tem a oferecer.

– Talvez você seja uma dessas pessoas que já ouviu alguém lhe dizer: “você é bonzinho demais. Esse é o problema, porque não vê maldade.” Não há nenhum problema em ser bom. Que bom que você o é. Não podemos perder a nossa essência e os nossos valores só porque o mundo é constituído por tantas pessoas que não são tão boas assim. O que não podemos é fechar os dois olhos para a maldade. Que sejamos bons, mas que a gente saiba muito bem usar essa grande bondade com as pessoas certas. Com as erradas, que não sejamos ruins, mas não podemos depositar grande confiança.

– Elogie. Mesmo que em um relacionamento, por exemplo, você já esteja há muito tempo com a pessoa e já tenha feito alguns elogios, você os pode repetir em algum momento. Que isso não se perca com o tempo. Vai lhe fazer bem e mais ainda para a pessoa que o recebe. Elogie pequenas atitudes e todo o esforço que alguém faz, independente de quem seja essa pessoa.

– Tenha empatia. É clichê dizer, mas de fato cada pessoa enfrenta batalhas internas. Nem todo mundo está bem sempre. Antes de julgar, olhe para o próximo com olhos de amor e tente, por mais desafiador que seja, entender por que alguém age como age. Ninguém é frio por acaso, ninguém é rancoroso porque decidiu ser assim. Sempre há um porquê por trás de cada história.

– Trabalhe, faça o que você gosta, mas não deixe de pensar também na sua qualidade de vida e de desfrutar de momentos especiais com quem você carrega no lado esquerdo do seu peito.

– Aceite os seus erros e aprenda com eles. Quem nunca se arrependeu de algo que fez? Não podemos apagar o erro cometido, mas podemos aprender com ele. Se pergunte: o que posso aprender com isso? O importante é não insistirmos no mesmo erro, mas isso é algo que vem apenas com a maturidade.

– Outro conselho é: sonhe! A importância do sonho é você quem dá. Quando as coisas parecerem difíceis, volte um pouco ao tempo em que você era criança e sonhava coisas que, por mais grandiosas que eram, você achava fácil de realizá-las. Após sonhar, tente, diariamente, praticar pequenas atitudes que lhe deixam mais perto da concretização do seu sonho. Um dia você vai chegar lá.

– Que dentro do seu coração você plante, todos os dias, a semente da esperança. Que você tenha paciência para esperar por dias melhores, por pessoas melhores, por uma saúde melhor, por uma vida mais leve. Regue essa esperança dentro de você. Ela vai brotar e uma mudança provocar.

– E, por fim, meu último conselho é: continue comigo até o fim desta história. Se você chegou até aqui, pode ter certeza de que isso me deixa muito feliz. Vem muita coisa boa por aí. Nos encontramos no próximo capítulo. Bora lá?

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Cabeça de criança

 

Ouvi muitas vezes, quando criança, a frase: “como é bom ser criança. É tudo tão mais fácil.”

Na época eu não dava bola e, na minha cabeça de criança, achava que era mentira. Eu não achava tão fácil assim ir para a escola todos os dias, acordar super cedo e voltar para a casa com mais uma série de atividades de tema. Não achava tão simples assim tirar notas muito boas na escola. Eu estudava muito para que isso acontecesse.

Mas hoje eu entendo. É bom ser criança sim e carregar essa inocência, essa pureza toda. Mas como também é bom quando a vida nos faz, muitas vezes na marra, aprender a lidar com sabedoria em meio às dificuldades e ainda nos torna mais maduros com os desafios. A maturidade geralmente se constrói após muitos momentos de dor e angústia, mas quando a temos, ela nos ensina a viver melhor e a dar mais importância ao que tem valor e não preço.

Mas, mesmo que a maturidade venha com o tempo, que tenhamos nos entristecido com tantas pessoas e situações da vida, que a gente não perca um pouco da essência de uma criança que é acreditar que os dias são bonitos, que todos os sonhos são possíveis, que todo mundo que morre vira estrelinha. Que a gente não perca a fé de acreditar que nenhuma situação é um problema grandioso e que é só fechar os olhos, dormir e acordar para ter um dia mais bonito e com novas chances de recomeço.

É, em vários momentos queria voltar a ter apenas a minha cabeça de criança para não enxergar e sentir a dor que a vida de adulto muitas vezes nos traz.

 

Sobre escolhas

 

Minha mãe se recuperou bem do acidente. Claro que nos primeiros dias não foi tão simples assim. Ela sentiu algumas dores, mas aos poucos tudo foi melhorando.

Não muito tempo depois do acidente, ela parou de trabalhar no lugar onde estava e apostou nas tarefas de casa. Meu pai estava trabalhando como torneiro mecânico. O salário não era muito, mas dava para pagar as despesas da casa.

O tempo foi passando e eu me via aprendendo com todos os momentos de dificuldade que meus pais passavam. Bem lá no fundo do meu coração, eu sabia que as coisas nunca foram muito fáceis para eles, mas meu pai tinha aquele dom de fazer as coisas parecerem bonitas, mesmo que estivesse tudo tão difícil. Tipo aquele filme “A vida é bela”, cuja história se passa na Segunda Guerra Mundial e o pai, um judeu que estava em um campo de concentração com o filho, faz de conta que toda a situação não passa de um grande jogo cheio de surpresas e que o vencedor recebe um caminhão-tanque. Meu pai era tipo o Guido do filme. Não tinha tempo ruim pra ele. O sorriso era diário.

Quando eu já tinha os meus 10 anos, percebi que o pai, conversando com a família, falava sobre a vontade que tinha de empreender e montar um negócio próprio. A ideia era abrir uma tornearia mecânica, serviço que ele já tinha conhecimento.

Meses se passaram e eu, sem entender muito as burocracias no mundo dos adultos, me dei conta de que realmente o pai tinha conseguido montar um espaço para empreender. Isso apenas foi possível por meio de um financiamento no banco.

Tivemos que nos mudar para o interior de São Paulo, porque era onde tínhamos um terreno, uma herança da família. Lá foi erguida a tornearia mecânica e, em cima do empreendimento, foi construída uma casa para morarmos. Passei a necessitar do ônibus para me locomover até a escola. E acredite: foi incrível!

Nas minhas viagens de ônibus até a escola, conheci muitas pessoas, muitas histórias. Apesar da pouca idade, sempre gostei de aprender, de conhecer gente e outras realidades.

Minha mãe passou a auxiliar meu pai nos serviços, com o auxílio da irmã dela, que cuidava da parte burocrática do negócio. Claro que minha mãe não entendia das coisas como ele, mas ajudava com o que era do alcance dela. Assim vi meus pais trabalhando juntos, se ajudando e mostrando o quanto a união vale a pena.

O início dos trabalhos no novo empreendimento também não foi fácil. Era preciso trabalhar muito. O serviço tinha demanda, porque meu pai realmente era muito bom no que fazia e não havia muitas pessoas na região que tinham o mesmo conhecimento que ele em tornearia.

Via ele seguido com as mãos sujas, manchadas de graxa e fazendo muita força para encaixar algumas peças. Certo dia, perguntei pra ele o motivo pelo qual ele tinha optado por esse negócio e por essa profissão. Ele me olhou com olhos de amor, pegou na minha mão e me puxou para o colo dele. Eu já era um “menino grande” e aquele colo estava pequeno para mim, mas fiquei feliz por estar ali, ao lado daquele grande ser humano. Foi então que ele me disse:

– Filho, na vida, muitas vezes, você vai fazer o que não gosta, até mesmo na profissão que você escolher. Mas fazer aquilo que não gostamos também faz parte da nossa trajetória. Muitas vezes, você também vai se sentir cansado, vai ficar desmotivado e terá muitas dúvidas se fez a escolha certa. E você sabe qual é a escolha certa?

Naquele momento fiz que “não” com a cabeça. Ele prosseguiu:

Eu também não sei qual é. Talvez nunca saberemos se fizemos a escolha certa para as nossas vidas. Mas quando escolhemos algo que nos faz bem, que nos motiva e que, de alguma forma, faz a diferença não só na nossa vida, mas na vida de alguém, talvez estejamos no caminho da escolha certa.

Respondendo à sua pergunta, fiz essa escolha, porque gosto do que faço, gosto de peças, gosto do processo das máquinas, mas, muito mais do que isso, eu gosto de refletir sobre o quanto o meu trabalho também pode estar relacionado à nossa caminhada em vida. Vendo as máquinas (qualquer tipo) funcionando, percebo o quanto cada peça é importante e o quanto uma precisa da outra para que a sua função de fato tenha valor. Mas, ao mesmo tempo que cada uma tem importância, algumas enferrujam, estragam, precisam ser trocadas.  

Na vida, as coisas não são muito diferentes. Cada um de nós, dentro da sua individualidade, é importante. Mas quando temos pessoas ao nosso lado que nos inspiram, nos amam, nos fazem bem e nos apoiam, a nossa vida passa a ter ainda mais sentido e valor. Essas são as peças valiosas que nos rodeiam. Somos importantes, mas juntos, ainda mais! Não enferrujamos, mas um dia nós também iremos partir e não estaremos mais aqui. Mas sabe o que verdadeiramente importa? Importa se deixamos um bom legado, se fizemos um bom trabalho (como uma ferramenta), se fomos capazes de ajudar o outro para que uma engrenagem toda, ou seja, muitas vidas, pudessem ter sentido.

Então, quando você tiver que fazer uma escolha, pense sempre no que faz sentido para você e para o seu coração. Escolha o que vai ao encontro do seu propósito e, se possível, que seja algo que também faça a diferença em tantas outras vidas.

Ouvi atentamente tudo aquilo que meu pai me disse. Depois que ele concluiu a fala, eu dei um sorriso e o abracei apertado. Só pensei pra mim mesmo: “Com certeza você já está deixando um dos mais lindos legados, meu pai”. Continuei o abraçando…

 

A escolha de uma amizade

 

Sou filho único e já senti em diferentes momentos a falta de ter um irmão ou irmã. Às vezes cansa brincar sozinho. Futebol, então, nem tem graça jogar.

Apesar da solidão de um filho único, sempre tive meus amigos. Não conseguimos agradar a todos e ser amigo de todos, mas minhas amizades nunca fizeram eu me sentir tão só.

Desde criança a simplicidade me encanta. Gosto de gente simples e de pessoas que tratam todos de forma igual. Acredito que cada pessoa é diferente, mas todo mundo merece respeito. Apesar de gostar muito disso, eu tive um amiguinho na infância que não agia assim.

Existem coisas que nos marcam. Esse meu amiguinho era um pouco mais velho que eu. Nos dávamos muito bem quando brincávamos apenas eu e ele. Minha mãe era amiga da mãe dele e certo dia fomos fazer uma visita. Na casa, já havia outra criança, um menino, e sua mãe. Mas, para mim, isso não era um problema. Poderíamos brincar todos juntos. No entanto, não foi bem o que aconteceu.

Meu amigo, o Vítor, parece que se transformava em outra pessoa quando alguém estava junto. Ainda mais quando era amigo dele e não meu. Resolvemos brincar de caminhãozinho. Vítor tinha uns caminhões e carrinhos lindos. Queria também ter brinquedos tão bonitos assim, mas meus pais não tinham as mesmas condições para comprar.

Peguei um dos caminhões, que nem era o mais caro e muito menos o mais bonito. Quando puxei para perto de mim, não deu nem tempo de apreciar a beleza daquele caminhãozinho, pois só vi uma mão tirando ele das minhas. Era o Vítor. Logo em seguida, me olhou nos olhos e disse:

– Não! Esse tu não pode pegar. Quem vai brincar com ele é o Rafael, que também vai ter outros caminhões. Pega isso aqui! Este é teu caminhão.

Quando ele disse isso, olhei para as mãos dele e vi que estava me entregando uma caixinha de leite vazia que havia tirado do saco de lixo que estava no pátio.

Senti algo muito ruim em meu coração. Não que eu não pudesse ser feliz e brincar com o simples, mas por que não dividirmos os tantos brinquedos que estavam ali?

Peguei aquela caixinha de leite e fiquei raspando no chão, fazendo de conta que meu caminhão estava andando. Olhei para o lado e visualizei o Vítor rindo e cochichando no ouvido do Rafael. Não dei muita importância.

Brinquei mais afastado, mas não é porque eu queria, mas sim, porque eles se afastavam de mim. Escutei o Vítor falando para o amigo dele em tom mais alto, justamente para eu ouvir:

– Olha ali Rafael, que caminhãozinho horrível que ele tem! Nem roda tem.

Os dois caíram na gargalhada e eu continuei brincando.

Mais de uma hora se passou e aquela brincadeira estava sem graça, porque eu brincava sozinho e só ouvia risadinhas.

Resolvemos comer picolé, mas precisávamos comprar. Nossas mães nos deram algumas moedinhas. A minha ajudou com muito mais, mesmo sem ter condições financeiras.

Nós três fomos, então, em um mercadinho localizado perto da casa do meu amiguinho Vítor. No caminho até o mercadinho, Vítor e Rafael fizeram questão de caminharem afastados de mim. Tentei não me importar com aquilo, mas na minha cabeça de criança ficava pensando: por que meu amiguinho me tratava com tanta indiferença? Eu não havia feito nada de errado que o magoasse.

Chegamos no mercadinho e fomos escolhendo os picolés. Vítor e Rafael escolheram os picolés mais caros e o restante do dinheiro não chegava para comprar outro picolé. Fiquei um tempo tentando achar no freezer um que fosse em um valor mais acessível e só escutei:

– Meu Deus, que demora pra escolher um picolé. Anda logo.

Quando percebi que o dinheiro de fato não iria chegar, comentei isso e os dois falaram:

– Então volta lá pra casa e pega mais dinheiro. E corre, não demora!

A mulher do caixa do mercado só observava a situação. Voltei correndo para a casa do meu amigo e avisei que precisava de mais algumas moedas, porque o dinheiro não havia chegado. Minha mãe pegou a carteira e entregou moedas em minhas mãos.

Voltei correndo para o mercadinho e, quando cheguei, apenas ouvi:

– Como demorou hein? Parecia uma tartaruga.

Baixei a cabeça por alguns segundos e depois levantei novamente. Então fui escolher o meu picolé. Pagamos e saímos dali.

Na volta foi a mesma coisa: andaram afastados de mim. Escutei o Vítor falando:

– Vai andando. Não precisa caminhar com a gente. Não queremos a tua companhia.

Fui caminhando sozinho com meu picolé, no silêncio da minha companhia.

Por estar na frente deles, cheguei, obviamente, antes na casa do Vítor. Vi nossas mães surpresas e ainda brincaram:

– Ué, faltou dinheiro de novo?

Fiz que não com a cabeça e depois respondi:

– Vítor e Rafael estavam andando mais devagar e eu mais rápido. Então acabei chegando antes.

A “dupla de dois” chegou logo depois. Ficamos mais uns minutos ali e eu resolvi não brincar mais. Percebi que minha mãe havia achado estranho. Logo depois fomos para casa. Aí chorei.

Meus pais me olharam e eu contei o que havia sentido com as coisas que passei e que tanto me marcaram negativamente.

Falei sobre meus sentimentos sentado no chão da sala, com um caminhãozinho em mãos. Meu pai sentou ao meu lado, também no chão, e pegou na minha mão. Senti que ele queria me dizer algo muito importante. E, sim, eu adorava ouvir as coisas sobre a vida que ele tinha para me dizer.

Ele me olhou bem no fundo dos meus olhos castanhos e falou:

Filho, nem sempre quem você considera amigo, teu amigo é. Você é muito novo e ingênuo para lidar com algumas coisas da vida, mas, aos poucos, vai perceber como as pessoas são e o que verdadeiramente importa. Na vida, muitas pessoas ainda vão te decepcionar, brincar com seus sentimentos e se aproveitar do seu bom coração, mas isso não diz sobre você! Diz sobre a maturidade delas, o caráter delas e sobre o coração delas. Embora por alguns instantes pareça que saímos perdendo nessas situações, lembre-se de que ninguém perde por ser do bem. Nossa alma sempre ganha e, de alguma forma, o universo conspira a nosso favor.

O que podemos fazer diante de situações como essa que você passou é refletir sobre nossas amizades e sobre quem importa. Você já se perguntou o quão bem o Vítor lhe faz? Será que atitudes como a que ele teve não lhe mostram como verdadeiramente ele é? Amigo pode até nos chatear por nos falar a verdade e puxar nossas orelhas, mas amigo não humilha, amigo não menospreza e nem nos afasta só porque tem outro amigo por perto. O Vítor pode ter te machucado com as atitudes que teve, mas você jamais agiria como o Vítor. O quão interessante ele é para a sua vida? Pense nisso.

Com o meu coração dolorido por ter me decepcionado com uma amizade, ouvi com carinho tudo o que meu pai me disse. Ele sempre tinha as palavras certas. Que incrível isso.

Enxuguei minhas lágrimas, olhei para o meu caminhãozinho e depois para o meu pai e só disse:

– Eu te amo, meu pai!

Depois dessa conversa, me afastei do Vítor. No começo foi estranho, mas depois fui percebendo, como o meu pai disse, quem realmente importa!

 

As marcas no coração

Sempre gostei muito de conversar com o meu pai. Às vezes, tínhamos umas conversas de homem para homem, mas, claro, eu era apenas um menino conhecendo algumas dores e injustiças deste mundo.

Em várias oportunidades eu ficava perto do meu pai antes de irmos dormir e ele fazia questão de me contar algumas parábolas ou compartilhar alguma história que trouxesse lição de vida. A minha mãe, com todo o amor que tem no coração, ficava por perto, também ouvindo atentamente tudo. Lembro até hoje de uma parábola contada por ele sobre a tábua e os pregos.

A parábola conta a história de um gurizinho extremamente nervoso e com temperamento explosivo. O pai dele, certo dia, deu-lhe um saco repleto de pregos, uma tábua de madeira e um martelo.

Ao entregar ao menino, o pai disse que toda a vez que ele brigasse com alguém ou falasse alguma coisa que ofendesse outra pessoa, ele deveria pregar um prego naquela tábua. Certa vez, em um único dia, ele chegou a colocar pelo menos 10 pregos na tábua. Mas pregar também dava trabalho e ele resolveu controlar mais suas emoções para não precisar realizar o processo toda a vez.

Tentando se controlar diariamente, em um dia ele sequer precisou colocar um prego na tábua. Foi quando ele contou ao pai que estava feliz por ter conseguido administrar melhor suas emoções, além de não precisar ter o trabalho de pregar. Ao ouvir isso, o pai pediu que o filho tirasse todas os pregos da tábua e trouxesse, de volta, os pregos e a tábua. Foi, então, o que o garotinho fez.

Ao receber a tábua, o pai olhou atentamente para o filho e disse:

– Parabéns por ter aprendido a controlar seus sentimentos e a não explodir com todas as pessoas. Agora olhe para essa tábua. Você tirou todos os pregos, mas se observar bem, vai perceber que ela está cheia de buracos e não foi assim que a entreguei. O que quero dizer com isso é que todos os seus xingamentos, explosões, palavrões não só marcaram essa tábua, mas também o coração das pessoas. Mesmo que você tire os pregos, os buracos ficam. Mesmo que você peça a alguém desculpa, as feridas nunca irão cicatrizar para sempre.

Na época em que meu pai me contou essa parábola, eu já havia ficado encantado, mas hoje, sem os meus pensamentos de criança, percebo o quanto isso tem significado. Sem me dar conta, desde criança meu pai me ensinou sobre deixar marcas.

Então lhe questiono: quais marcas você tem deixado no coração das pessoas? O que você faz hoje para que as pessoas carreguem você de uma forma sempre tão bonita no lado esquerdo do peito?

Meu pai não só me ensinou e ensinou minha mãe sobre marcas, mas marcou de fato a minha vida. Seja nas brincadeiras, na atenção dada durante a minha infância, nos conselhos compartilhados em momentos de angústia e aflição. Talvez nem ele sabia, mas ele deixava marcas todas as vezes que brincava comigo, me ensinava a ler, me dava um abraço de boa noite todos os dias antes de dormir. E marcas são eternas, sejam elas boas ou ruins.

Se você é pai ou mãe pense no que você está semeando para o seu/sua filho (a) colher depois. Reflita sobre o que você está fazendo de tão valioso para que o seu/sua filho (a) lembre sempre de você até mesmo quando não estiver mais aqui. Se você não é pai ou mãe, você com certeza deve ser amigo (a) de alguém. Então pense no tipo de amigo (a) que você se tornou, quais os seus esforços para que essa amizade se mantenha, o quanto você se doa para ver a pessoa que você gosta bem. Quais marcas você tem deixado no coração do seu/sua amigo (a)?

É, talvez meu pai realmente não tenha se dado conta das tantas marcas bonitas que ele deixou e do quanto sobre elas ele me ensinou.

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O plantio das árvores

Quando meu pai construiu o empreendimento dele em um terreno herdado, ele precisou cortar algumas árvores para que tivesse espaço para executar a obra. Após isso, tivemos que fazer o plantio de novas mudas para não decepcionar a Mãe Natureza, tampouco prejudicá-la.

Eu, ainda criança, auxiliei nesse plantio com o que era do meu alcance. Foi incrível, ainda mais porque sabíamos que estávamos fazendo algo bem importante para a natureza.

Mas não é tanto sobre ser incrível onde quero chegar. Isso tudo hoje me faz refletir sobre experiência. Quando fizemos o plantio, muitas pessoas da minha família se reuniram. Fizemos uma força-tarefa. Nos ajudamos muito. Lembro dessa experiência como se fosse ontem e o que posso dizer sobre tudo isso? Que é muito importante colecionarmos memórias, mas memórias positivas com as pessoas.

Naquele momento, vi o quanto a união também é importante em prol de um propósito, o quanto uma família tem o seu valor e o quanto uma simples atividade pode ser tão marcante – às vezes por uma vida inteira.

Essas árvores cresceram, deram frutos e é sobre isso que também quero falar. Quando fazemos algum plantio de uma árvore frutífera ou de qualquer árvore que seja, no fundo de nossos corações temos consciência de que talvez não iremos saborear os frutos ou, então, desfrutar da sombra, porque, quem sabe, não iremos estar vivos até lá. Ou talvez quem nos auxiliou a plantar seja a pessoa que não tenha essa oportunidade e experiência.

Mas se pensarmos muito nisso, nunca iremos plantar algo ou realizar alguma tarefa em vida, porque realmente nunca sabemos como será o dia de amanhã, já que ele é tão incerto. Penso que se nós não colhermos os frutos, alguém colherá. Frutos da nossa dedicação, dos nossos esforços, da nossa essência. Essência, porque, muitas vezes, sem nos darmos conta, nós inspiramos alguém positivamente. E se esse alguém ter atitudes do bem, em algum momento o mundo irá conspirar positivamente a seu favor e essa pessoa colherá os frutos.

O plantio dessas árvores em família me fez refletir também sobre legado e sobre o exemplo que damos às próximas gerações. Vi meus pais trabalhando, meus familiares ajudando. Isso me marcou e também fez crescer em mim a fraternidade, a busca pela união e o trabalho em equipe. Por que não ser melhor no mundo se todos os dias o Cara lá de cima me dá oportunidade pra isso?

A gente não sabe se amanhã estará vivo. A gente não sabe se vai colher os frutos ou desfrutar da sombra das árvores que plantamos, do amor que semeamos, do bem que fazemos. A gente não sabe agradar todo mundo, mas a gente sabe que nossas atitudes podem servir de exemplo e que o nosso plantio pode criar memórias. Então você já parou para refletir: qual o valor que tem para as pessoas a sua história?

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O preço por ser bom

 

Meu pai foi fazendo seus clientes com o empreendimento dele. Mas ele também passou muito trabalho durante a vida de empreendedor de uma tornearia mecânica.

Certo dia, quando eu estava perto dele, fiquei observando o talento que ele tinha. Muito antes de eu nascer, soube que ele já havia até trabalhado em uma montadora de carros. Ele entendia de carros também. Algo que me encantava. Como uma pessoa poderia saber tantas coisas e dominar tantas áreas?

Devido ao conhecimento dele com carros, vez ou outra chegava um cliente e solicitava alguma manutenção de automóvel. Meu pai auxiliava com o que ele podia. Assim como havia pessoas incríveis que passavam por lá, algumas também não tinham uma presença muito agradável.

Observando ele trabalhar, me dei conta do quanto era dedicado e ficava atento a todos os detalhes. De repente, um homem estacionou um carro em frente à tornearia mecânica. Logo me assustei, porque ele parecia brabo.

Meu pai foi ao encontro dele e o recebeu com um simpático “bom dia”. O homem, chamado Roberto, por sua vez, apenas respondeu: “Opa, José”. Deu um problema aqui e acho que tu tem a ver com isso”.

Meu coração passou a bater mais rápido, mas continuei olhando atentamente aquele homem. Roberto, então, prosseguiu:

– Vim aqui esses dias para você dar uma olhada no carro e acho que você conseguiu estragar ele. Parabéns! Às vezes nem liga mais, outras vezes funciona.

Meu pai, respondeu:

– Olha cara, eu acho que não! Tu já deu uma verificada nas outras partes do carro? Ou já parou para pensar que pode ser a gasolina?

– Eu fui viajar e abasteci em um posto de outra cidade que estava com a gasolina muito barata, mas não pode ter sido a gasolina. Mais fácil você ter cometido um erro. Gastei um dinheiro aqui pra estragarem meu carro. É brincadeira!

Conhecendo meu pai, ele tinha certeza de que não havia feito nada para prejudicar o carro daquele homem. Aquilo que fugia do entendimento e conhecimento dele, ele não mexia. Mas meu pai era coração bom demais. Não discutiu e resolveu devolver o dinheiro para o homem. Aquele homem arrogante foi embora! Um ano depois, ficamos sabendo, por meio de terceiros, que ele havia comentado para alguém que de fato o problema era a gasolina. No entanto, sequer foi até meu pai para pedir desculpa pelo que fez. Ahh, as pessoas! Como elas nos decepcionam.

Mas não foi apenas por situações assim que meu pai passou. A sua bondade sem tamanho e até o excesso de empatia fez com que, durante muitas vezes, ele fizesse o serviço e deixasse as pessoas pagarem outro dia. E todas pagavam outro dia? Claro que não!

Por muitas vezes ele teve gastos e sequer foi recompensado por isso. Deixou de ganhar muito dinheiro por ter dado crédito a algumas pessoas. Mas o tempo foi passando e eu percebi que ele havia aprendido com isso, porque a possibilidade de pagar em outro momento ele só dava para as pessoas extremamente confiáveis e conhecidas.

O que meu pai passou me faz refletir, hoje, sobre pessoas e sobre confiança. Não é tão simples assim lidar com pessoas. Além de grosseiras e arrogantes, poucas são de confiança.

Também passei a pensar que por mais bons que sejamos, nunca iremos agradar todas as pessoas e por mais que confiamos no trabalho que desempenhamos, sempre pode existir um Roberto que duvida e que nos trata com grosseria.

Por isso, digo que precisamos ser bons, mas não podemos são tão ingênuos ao ponto das pessoas pisarem em cima de nós e se aproveitarem da nossa bondade.

Roberto me ensinou que na vida sempre vão existir pessoas como ele. Vamos nos deparar, muitas vezes, com pessoas que duvidam do nosso trabalho e nos dizem que estamos completamente errados, embora estejamos certos.

Em alguns momentos é necessário nos impor, mas, em outros, até penso que vale a pena agir como meu pai: não brigar, nem ficar revidando, muito menos discutindo. Em algumas situações é preciso deixar a pessoa falar.

Uma vez ouvi que os verdadeiros sábios observam em silêncio e fazem questão de não discutir. Meu pai era uma dessas pessoas. Muitos Robertos vão passar pelas nossas vidas, duvidando de nossos talentos, mas quando temos certeza do que somos e daquilo que fazemos, eles podem até se dar por vencidos, mas não arrancam de nós a nossa essência.

Que sejamos menos como Roberto e mais como José!

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A gente dá um jeito

Uma das tantas coisas que aprendi com meus pais foi tratar todas as pessoas com respeito e educação. Por mais clichê que seja ouvir que cada um carrega consigo uma batalha interna, essa é a mais pura verdade, porque nós nunca sentiremos o que a outra pessoa sente e nem passamos por aquilo que ela passa. Meus pais sempre diziam que não podíamos ficar comparando as dores de uma pessoa às dores de outra. Justamente porque cada pessoa sente de uma forma diferente. O que dói em mim, nem sempre dói no outro.

Penso que entre as atitudes mais bonitas que podemos ter em sociedade é justamente esse “respeitar”. Respeitar as escolhas, respeitar as dores, respeitar os sonhos. E por falar em sonhos, isso me fez lembrar de uma manhã fria de inverno em que eu e meu pai sentamos ao lado do fogão a lenha que ele tinha em um cantinho da tornearia mecânica dele. Apesar de meu pai ser dono do próprio negócio, ele sabia que o meu sonho mesmo era ser enfermeiro e que eu não iria trabalhar ali.

Ele esquentava as mãos nas proximidades do fogão quando, de repente, falou com carinho:

– Sabe filho, esse investimento que o pai fez aqui custou caro, mas você não precisa se preocupar com isso e com o que fazer depois que eu não estiver mais aqui. Eu sei que o seu sonho é ser enfermeiro e eu respeito esse sonho. Siga o seu coração, faça aquilo que você gosta que com o resto a gente dá um jeito.

Talvez meu pai não tenha se dado conta, mas naquele momento ele também me mostrou o quanto é importante apoiarmos as pessoas que amamos naquilo que elas são felizes e verdadeiramente gostam. Quando temos apoio, por mais desafiador que tudo pareça ser, a caminhada fica um pouco mais leve.

Não importa se o seu sonho é grande ou pequeno. Se ele demora para ser realizado ou não. O importante é o quanto ele significa para você e faz o seu coração pulsar mais forte. Até hoje lembro do meu pai falando, como se fosse ontem: “Faz o que você gosta! O resto a gente dá um jeito!”. É, penso que na vida sempre há algum jeito de fazermos o que nos faz feliz!

 

 

O Papai Noel

Aprendi já na minha infância que não podemos ter tudo o que queremos, mas que, se formos merecedores, o Cara lá de cima se encarrega de nos presentear de alguma forma. É justamente por eu saber que não posso ter tudo o que quero, que sempre dei valor a tudo que tenho.

Quando chegava uma data comemorativa como, por exemplo, o Natal, meus pais faziam um esforço para que pudessem me dar algum presente. Além do carinho e amor que me davam, sempre tornavam essa data comemorativa um momento de pura magia, tanto que demorei para desacreditar em Papai Noel.

Quando questionei aos meus pais sobre como poderiam existir tantos Papai Noéis com aparências diferentes, sendo que existia apenas um, meu pai José já tinha a resposta na ponta da língua:

– Todos eles são ajudantes do Papai Noel verdadeiro.

Também questionei como o Papai Noel consegue entrar pela chaminé e deixar nosso presente dentro de casa. Eis que surgiu a resposta:

– Ele tem uma chave mágica que permite que ele entre nas casas.

Eu achava tudo isso incrível. Ficava imaginando como ele poderia estacionar o trenó dele sem ninguém ver e entrar dentro das casas em um momento em que ninguém estivesse na residência. Na minha cabeça de criança eu apenas pensava: Papai Noel devia ser muito esperto para saber direitinho o momento em que ninguém estivesse em casa.

Grande parte da minha infância teve uma boa pitada de magia, porque meus pais faziam tudo parecer mais leve do que realmente era.

Quando descobri que Papai Noel não passava de um personagem, que ele não vinha de trenó, muito menos do Polo Norte, fiquei triste, mas, ao mesmo tempo, me dei conta do quanto nos faz bem acreditar, ter esperança, sonhar e viver essa magia.

Certo dia, quando eu já sabia que Papai Noel não existia de fato, sentei ao lado do meu pai na sala. Perguntei para ele por que os adultos criam toda essa história e fazem as crianças demorarem para desacreditar no velhinho que carrega o saco vermelho.

Foi, então, que ele me questionou:

– E não é bom acreditar em Papai Noel? Você não gostava?

Respondi imediatamente:

– Claro que é bom. Eu gostava sim, e muito!

– Então por que não fazer meu filho acreditar em algo que é bom, saudável, mágico e que tem todo um significado por trás?

Ficamos uns segundos em silêncio e depois ele continuou:

– A vida da gente nos reserva muitas batalhas. Momentos bons e outros nem tão bons assim. Enquanto houver a oportunidade de acreditar em magia, em pureza, não tem problema acreditar. E por falar em acreditar, a gente acredita em tanta coisa e também não sabemos se é verdade. A gente acredita em algumas pessoas e nem sempre elas são confiáveis. A gente acredita em um mundo melhor, mesmo sabendo que não somos capazes de mudar o mundo. A gente acredita no amor, mesmo que estejamos em um relacionamento tóxico. Se acreditamos em tantas coisas que não são boas, por que não acreditar na magia? Se eu pudesse, acreditaria em tanta coisa, mas eu sei que a vida da gente não é magia e não tem Papai Noel de verdade.

Neste momento, meu pai fez uma pausa, olhou atentamente para a paisagem por trás da nossa janela. O dia estava lindo. Havia sol. Natureza. Flores. De repente ele sorriu, olhou para mim e continuou:

– Às vezes, meu filho, o problema não está em acreditar, mas, sim, nas coisas que acreditamos e que nem sempre merecem a nossa confiança e a nossa energia. Mesmo que o mundo nos traga muitas incertezas, dúvidas, angústias, tem uma coisa que sempre, mas sempre mesmo, você deve acreditar: em você, no seu potencial, nos seus sonhos e na sua vontade de fazer a diferença! Sabe por que meu filho? Porque se nem você acreditar em si mesmo, ninguém vai!

 

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A melodia da vida

 

Se cada um de nós voltar no tempo e lembrar da própria infância, é normal recordarmos de momentos bons e outros nem tão bons assim. Há quem, infelizmente, passou por mais situações difíceis do que fáceis. Independentemente se a história for boa ou ruim, a verdade é que tudo nos marca de alguma forma e fica eternizado na nossa memória ou subconsciente.

Carrego comigo, no meu coração, muitas pessoas, mas se volto no tempo, me recordo de muitos momentos especiais com meu pai José.

Ele tinha o costume de brincar comigo dizendo que filho dele tinha que saber dançar bonito. E ele não apenas falava isso, mas também fazia questão de me ensinar os passos. Não foi uma, nem duas vezes, que ficávamos na sala de casa ouvindo música e ele, após um sorriso, dizia:

– Está escutando filho? Presta atenção neste ritmo. Consegue perceber que a batida permite que a gente dance de “dois em dois”?

Fiz que sim com a cabeça. Então ele continuou:

– O mais importante é você buscar entender a batida da música. Assim já é meio caminho andado para você saber quais passos pode dar de acordo com o ritmo.

Assim fui aprendendo. Às vezes, ele mesmo fazia questão de me conduzir para tentar me mostrar qual o ritmo da música. Hoje, o que sei de “dança a dois” é o que aprendi com ele.

Parecia algo muito simples e, em alguns momentos, até chato ter que parar minhas brincadeiras de criança para aprender a dançar. Passados alguns bons anos, hoje eu reconheço que meu pai apenas tinha a preocupação de me ensinar algo bom, que me marcasse, que pudesse ser importante pra mim em algum momento da minha vida. Hoje, entre as tantas coisas boas que eu poderia desejar a alguém, desejo apenas que tenham um pai, uma mãe, um amigo ou algum parente que o marque intensamente e que lhe tenha tentado ensinar, de alguma forma, o “ritmo da dança da vida”.

Muito mais do que dançar, meu pai José me ensinou que na dança da vida nem sempre a gente acerta os passos. A gente erra. Tropica. Até cai. Em alguns momentos, dançamos com uma pessoa. Em outros, ela não está mais conosco. Na dança da vida nem sempre a gente escuta a música que gostaria. Mas o bom é que a música também muda e a gente passa a ter momentos prazerosos com a música e com o par que escolhemos.

Meu pai me ensinou que no decorrer da vida também vamos ter que dançar sozinhos, porque existem coisas que apenas nós podemos aprender sozinhos e fazer por nós mesmos. Mas está tudo bem, porque uma hora ou outra, alguém sempre aparece para dançar com a gente a dança da vida de novo. Porque, seja na dança ou na vida, a música faz mais sentido quando dançamos com mais alguém.

Hoje eu carrego mais habilidade para dançar em comparação à época em que aprendi as coisas com meu pai. Acho que dancei tanto na vida, passei por tantas coisas, que fui aprendendo melhor as diferentes melodias. O que apenas posso dizer é que a dança e a melodia do meu pai, até nos dias de hoje, vivem e tocam dentro de mim.

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Os olhos do menino

 

Tenho percebido que cada vez mais cedo crianças hoje em dia utilizam óculos. Talvez o uso frequente das telas, seja computador, celulares, televisão, smarthphone ou outras ferramentas possam ser os principais responsáveis por isso.

E fui mais uma entre as milhares de pessoas no mundo que sentiu necessidade de comprar óculos. Não que eu não estivesse enxergando bem. Porque sim, eu estava enxergando. Mas percebi que os óculos para descanso fariam bem para os meus olhos.

Fomos eu e meu pai a uma consulta. A mãe ficou na tornearia mecânica para organizar as coisas e agendar os serviços com os clientes. Nunca fui muito fã de consultórios, mas aquele de fato era diferente. Lindo! Sentamos na recepção e ficamos aguardando a secretária nos chamar. Passei a observar tudo ali. As paredes eram brancas, como na maioria dos consultórios, mas me chamou atenção as plantinhas que estavam lá. Muito coloridas, davam uma vida ao ambiente e fugiam do que era normal encontrarmos em um consultório. O balcão da secretária era alto e ela ficava quase escondida atrás dele. Ela se chamava Angélica e era muito sorridente. Passei os olhos por cada detalhe, quando vi que, próximo ao balcão, havia um menino e o seu pai. Me chamou atenção, porque ao mesmo tempo que a criança olhava para mim e conversava, percebi que, na verdade, ela estava falando com o pai dele. Sim, percebi que o menino era cego. Prestei mais atenção naquelas duas figuras humanas, quando ouvi o garotinho perguntando para o pai:

– Pai, como está o dia lá fora?

E o pai respondeu:

– Lindo, meu filho. Todos os dias são lindos.

Olhei para a janela que havia naquela sala de espera e através do vidro dava para visualizar o tempo no lado de fora. Pelo que percebi, tinha grande chance até de dar um temporal. Os galhos das árvores balançavam muito, o céu estava escuro. Havia muito vento lá fora. Não entendi muito bem o que havia de lindo nesse dia, mas pensei para mim que cada pessoa tem os seus gostos.

Os minutos iam passando e de fato estava demorando para eu ser atendido. O garotinho e o seu pai também continuavam na sala. Havia um silêncio naquele local e o menino novamente começou um diálogo com o pai dele:

– Papai, tem muita gente nesta sala? Como são as pessoas?

– Há umas 5 pessoas além de nós. E como elas são, filho? Ahhh, elas são muito especiais, porque elas são seres humanos. Elas merecem nosso respeito sempre, assim como todas as demais pessoas que passarem por ti na sua caminhada.

– E pai, eu estou bonito hoje?

– Filho, você é nosso diamante e sempre vai ser bonito, porque você brilha e é a maior riqueza que eu e sua mãe poderíamos ter.

A conversa parou por ali, porque logo depois escutamos a secretária falar:

– Renan! É a sua vez, pode entrar.

Então o menino, agarrado ao pai, se levantou. Sendo guiado, foi em direção ao oftalmologista.

Passaram-se alguns minutos e eu, sem conseguir ficar quieto, perguntei ao meu pai – parecendo o menino fazendo questionamentos.

– Pai, por que para ele o dia está lindo se vai dar um temporal lá fora? Por que ele falou que somos especiais se nem nos conhece? E esse menino nem era tão bonito assim, né?

Meu pai sorriu bem na hora que finalizei a frase e disse:

– Filho, o menino não enxerga e talvez nunca tenha a oportunidade de enxergar as belezas da vida. Mas ele pode sentir e imaginar. Toda a vez que o pai dele diz que o dia está lindo, automaticamente, na imaginação dele, ele vai imaginar o dia mais lindo que ele pode. Além disso, o dia fica bonito dependendo da cor que nós mesmos damos a ele.

Ele nos chamou de especiais, porque ele quer, de certa forma, mostrar ao filho que todas as pessoas podem ser, pois cada uma é especial à sua maneira. Além do mais, somos seres humanos e todos merecemos ser respeitados. E o menino é bonito sim. Olha como ele é educado e como é amoroso com o pai dele?!

Após ouvir meu pai, fiquei pensativo. É, eles tinham razão. Passaram-se mais alguns minutos e vi o menino novamente agarrado no pai, saindo da sala do oftalmologista. Com sorrisos, ele e o pai nos deram tchau e foram embora.

O dia ficava cada vez mais escuro e o temporal se aproximava. Após abrir a porta para sair do consultório, só escutei o menino falando:

– Nossa! Que dia lindo hoje, né pai?

E atrás do balcão, a voz da secretária:

– Antônio! É a sua vez, pode entrar.

 

Um banco, o balanço e o temporal

Meu pai era torneiro mecânico, mas, para mim, ele sempre foi muito mais que isso. Ele sabia fazer tantas coisas.

Um dia, quando cheguei da escola, vi ele dentro da tornearia pregando algumas tábuas. Logo vi que ao lado daqueles pedaços de madeira havia um outro balanço de madeira feito por ele.

Apenas sorri e espontaneamente disse:

– Uaaaau!

Foi quando meu pai percebeu que eu estava ali.

– Gostou filho? Fiz esse balanço para colocarmos no nosso pátio, conversarmos e nos reunirmos. Mas estou ainda fazendo esse banco para sentarmos, porque um balanço apenas não chega se recebermos visita né?

– Que lindo, pai! Vai ficar tão bonito aqui. Como conseguiu fazer isso?

– É a vida, meu filho, ela já me ensinou tanta coisa.

Naquele momento, minha mãe se aproximou e também ficou encantada. Logo, deu um beijo no meu pai.

– Ficou incrível, José! Você é um grande homem.

Minha mãe também sabia valorizar as coisas que fazíamos. Assim como meu pai, o coração dela sempre foi grandioso.

Como estava com fome, resolvi entrar em casa e comer alguma coisa. Meu pai ficou ali por mais algum tempo para finalizar a mais nova invenção dele. Cada vez eu o admirava mais.

No dia seguinte, como de costume, fui à escola. Parecia que iria chover, mas fiquei em dúvida se de fato deveria levar meu guarda-chuva ou não.

Quando comecei a caminhar para ir até a parada de ônibus, só ouvi minha mãe de longe dizendo:

– E o guarda-chuva, Antônio? Vai vir chuva hein?

Na verdade, nunca gostei de ficar segurando um guarda-chuva, mas como quase sempre as mães sabem das coisas, optei por ouvi-la. Ela veio ao meu encontro e eu caminhei ao encontro dela. Momento em que ela me entregou o guarda-chuva.

Durante a aula de Biologia o temporal começou a “dar as caras”. Um vento forte tomava conta e a tensão também já estava no ar. Todos estavam preocupados.

Em poucos segundos veio a chuva forte, misturada com um vento muito forte também. O diretor Franklin entrou na nossa sala, cochichou no ouvido da profe Margarete e foi embora.

Demoraram aproximadamente 2 minutos, quando a profe disse:

– Turma! Prestem todos atenção agora! O temporal foi muito forte e destelhou algumas casas. Os pais e responsáveis de vocês pediram para que avisássemos, mas que vocês mantivessem a calma. Não sabemos exatamente quais casas foram atingidas, mas pedimos que não se desesperem, embora possa ter acontecido alguma coisa na casa de vocês.

Fiquei preocupado! Como estariam as coisas lá em casa?

A partir daquela notícia a sala de aula ficou movimentada e acabamos nem falando mais sobre o conteúdo de Biologia em si. Era a última aula do dia e, após, todos nós iríamos para as nossas casas. Aliás, esperávamos que todos ainda tivessem uma casa.

Peguei o ônibus aflito e, quando desci dele, saí correndo até a minha casa. Quando cheguei, percebi que, logo à frente da tornearia mecânica do meu pai, o banco e balanço haviam quebrado. O vento foi tão forte que os levou. Eles baterem em uma árvore e as madeiras acabaram quebrando. Fiquei triste!

Caminhando um pouco mais percebi que os vidros do empreendimento do meu pai também quebraram, assim como as telhas. Inundou boa parte da tornearia, mas nem tudo estava perdido.

Logo encontrei meu pai José e minha mãe Joana. Assim como eu, estavam aflitos. Na nossa casa, localizada em cima da tornearia, também foram registrados alguns estragos.

Eu, na minha cabeça de criança, sabia que isso era um problemão, mas não fazia ideia do quanto gastaríamos para colocar tudo em ordem de novo. Após pensar isso, abracei meus pais apertado e acredito que toda a aflição que eu tive começou a ser colocada para fora por meio do meu choro. Chorei muito!

Meus pais me abraçaram ainda mais apertado e então uni forças para falar:

– E agora pai? E o balanço? E o banco? E nossa casa? Vamos conseguir pagar tudo isso?

– Calma, meu filho! O teu pai aqui vai dar um jeito!

Sabe, ele sempre tinha uma forma de dar um jeito em tudo, mas me doía o fato de que ele tinha que dar um jeito sempre em situações difíceis. Talvez esse fosse um dos vários dons heroicos que ele tinha.

Naquele dia nem jantei. Fui direto para o quarto e novamente olhei para a janela, como sempre faço quando quero pensar sobre a vida. Vi que o temporal havia passado e que o céu estava, de novo, cheio de estrelas. Como isso poderia acontecer? Durante o dia foi um caos! Tantas casas destruídas, tantos corações despedaçados e a necessidade de recomeçar.

Passaram-se alguns minutos e continuei olhando para o céu. Parece que algo me dizia para eu acalmar meu coração. Foi quando pensei e falei baixinho para mim mesmo:

– E que bom que ainda existe a oportunidade de recomeçar. Papai do Céu nos dá, todos os dias, oportunidades de recomeço. De começar um novo dia sendo mais gentil, mais calmo, menos invejoso, mais humano, mais comprometido. Se podemos escolher recomeçar como pessoas, por que não seria possível recomeçar comprando novos bens materiais?

Meus pensamentos eram um pouco mais maduros para uma criança da minha idade, 11 anos. Nunca soube se eu tinha problemas por pensar como penso ou se de fato havia dentro de mim um entendimento um pouco diferente sobre a vida. Continuei pensando:

– Tudo, de repente, pode mudar! A gente não escolhe se faz frio ou calor, se chove ou não, se tem temporal ou calmaria. Mas a gente pode escolher o que fazer com o que sentimos. Meu pai estava tão feliz construindo aquele balanço e aquele banco, mas tudo mudou. O balanço estragou. O banco quebrou. O telhado se foi. Existem coisas que realmente não temos como mudar. Mas existem situações que podemos recomeçar.

A gente não sabe nem se vai estar vivo amanhã. Eu também não sei nem se os pedaços de madeira vão estar amanhã na frente de casa, mas eu sei o que senti quando vi meu pai feliz construindo algo para a nossa família. Talvez por isso meu pai tanto fala que o que fica, muitas vezes, são apenas memórias! E que bom que, apesar de todo o estrago causado pelo temporal, aquele banco quebrado e aquele balanço despedaçado puderam criar lindas memórias em mim! Porque, no fundo, eu sei que meu pai é o melhor arquiteto e engenheiro que a nossa família poderia ter.

 

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Então é Natal e o que você fez?

Quando o fim do ano se aproxima, é bem normal muitos de nós ficarmos mais emotivos e reflexivos. Algumas pessoas se dão conta de que os dias parecem ter passado rápido demais e pensam sobre tudo o que fizeram e viveram no ano que passou.

Não sei em qual momento da sua vida você está lendo esse livro, mas mesmo que não seja no fim do ano, vale você se perguntar: as horas/dias passaram e o que eu fiz?

Acredito que à medida em que crescemos, o tempo de fato se torna precioso, pois é cada vez mais raro termos TEMPO DE QUALIDADE com as pessoas que amamos. Me refiro àquele tempo em que a gente se dedica exclusivamente à pessoa, sem pensar em outras coisas e sem ficar interrompendo uma conversa para responder algo no celular referente ao trabalho.

Eu, particularmente, sempre gostei de Natal. Sei que nem todas as pessoas têm esse mesmo pensamento. Se paro para pensar sobre o porquê de eu gostar dessa data, talvez seja em função do que vivi na infância e das marcas registradas em mim. Volto, aqui, a falar sobre criar memórias.

Com a proximidade do Natal, era tradicional montarmos a árvore natalina lá em casa. Além de dar um brilho todo especial à casa, acredito que as memórias que construí ao montar o pinheirinho é o que realmente faz eu lembrar de tudo com carinho.

Lembro-me de quando, em um canto da sala, estávamos eu, meu pai e minha mãe montando o pinheirinho. Delicadamente minha mãe pegava cada uma das bolinhas e colocava no pinheirinho. Aquele momento tornava-se apenas meu e dos meus pais. Conversávamos sobre diferentes assuntos e mesmo que fosse um pinheirinho pequeno e simples, tudo fazia meus olhos brilharem igual.

Não tínhamos muitos enfeites para colocar na árvore de Natal. Alguns já haviam quebrado e embora gostássemos de pinheirinho, gastar dinheiro com enfeites para a data nunca foi uma prioridade dos meus pais.

Quando colocamos o último enfeite, nos olhamos com carinho e nos abraçamos. Mesmo que faça muitos anos, nunca vou esquecer do que meu pai me disse naquele dia:

– Filho, porque você gosta tanto de montar a árvore de Natal?

– Ah pai, é porque eu acho que fica tão bonito um pinheirinho enfeitado dentro de casa.

Ele abriu um sorriso e continuou:

– Isso é o que você acha, mas, no fundo do seu coração, há uma outra resposta para isso. Os enfeites que colocamos na árvore são muito simples e, alguns deles, muito velhos. Do que você gosta mesmo é deste nosso momento. Todos os anos o pinheirinho é montado e desmontado. Ele morre e você não dá bola, porque sabe que no ano seguinte vamos montar outro de novo.  Mesmo que você tenha certeza de que terá outro pinheirinho no próximo ano, no seu inconsciente você reconhece que não sabe se no próximo ano estaremos nós três juntos aproveitando esse momento novamente. O pinheirinho fica bonito não apenas pelos enfeites em si, mas porque nós três, juntos, o montamos com amor.

Acredito, meu filho, que situações semelhantes ocorrem em outros momentos da nossa vida, pois passamos a admirar alguém e achar alguém especial não pela aparência física em si, mas pelo amor que sentimos por essa pessoa. Um encontro com alguém que amamos não se torna apenas especial, porque o lugar do encontro é bonito, mas porque temos apreço pela pessoa. O que quero dizer com tudo isso é que o importante é o que vivemos no momento, é o amor em si e o tempo de qualidade com quem amamos! Tudo se torna mais incrível assim.

Acontece que as pessoas não são como um pinheirinho de Natal que morre e no ano seguinte é trocado por outro. Por isso, digo que não é do pinheirinho em si que você gosta, mas do momento dedicado a montá-lo com as pessoas que ama. Diversas coisas na nossa vida nos encantam, porque nos remetem à alguma memória especial.

Por isso, meu filho, é tão importante vivermos de verdade e colecionarmos memórias especiais para podermos chegar no fim do ano respondendo com orgulho a pergunta: então é Natal e o que eu fiz? “Fiz tudo o que podia para ser feliz.”

———

O que posso aprender com isso?

Meu pai nunca foi uma pessoa que demonstrava quando estava preocupado ou com raiva, mas eu sei que ele passava por diversas dificuldades. As coisas não eram fáceis. Diferente da minha mãe, porque quando ela estava irritada, era perceptível (risos).

Admirava essa capacidade do meu pai de saber lidar melhor com os sentimentos, sem descontar as angústias, medos e estresse em pessoas que não tinham nada a ver com isso. Mas sabe, o que percebi é que quando meu pai não estava bem, ele sempre, sempre mesmo, cantava.

Um dia, quando ele estava na tornearia mecânica a sós com a minha mãe, ouvi escondido ele se queixando, dizendo que o movimento estava fraco e que as burocracias para deixar o negócio funcionando dentro da lei tornavam-se caras.

– Não é fácil, baixinha (como ele carinhosamente chamava a minha mãe). O cara trabalha e trabalha, deixa tudo em dia com as leis, mas parece que igual nunca sobra dinheiro. Daqui uns dias já temos que pagar de novo a parcela do financiamento do banco. O dinheiro só vai.

Minha mãe ouvia meu pai e fazia que sim várias vezes com a cabeça. Depois ela saiu dali apreensiva, enquanto Seu José começou a cantar e assobiar.

Foi então que me aproximei dele e fiz uma pergunta que me deixava curioso pela resposta:

– Papai, por que você canta? E por que você canta apenas em alguns momentos e não todos os dias?

– Quem canta, seus males espanta, meu filho! – respondeu ele com uma gargalhada.

Depois continuou:

– Nem sempre o pai está bem. Às vezes estou preocupado, mas do que adianta ficar se lamentando por aí e descontando tudo isso nas pessoas? Ninguém tem culpa das nossas angústias internas. Isso serve de lição pra ti, meu filho! Toda a vez que algo lhe incomodar, pense bem para quem você deve falar isso e de que forma você vai lidar com a situação. Eu canto, porque eu sei que apesar de algo me incomodar, a vida é bela na sua essência. Apesar de em alguns momentos me revoltar por algo ter acontecido, penso e me pergunto: “Não consigo mudar o que aconteceu, mas o que posso aprender com isso?”

Essa forma de lidar com as dificuldades era admirável. Enquanto algumas pessoas brigavam, batiam, gritavam, meu pai cantava e tentava aprender com tudo. Então ficava pensando para mim: “e se algum dia alguém fizesse algo muito ruim comigo ou com a minha família, como será que vou lidar com isso? Será que vou cantar?” Balancei a cabeça em meio a esses pensamentos enquanto meu pai me olhava. Na verdade, não queria pensar que algo aconteceria com meus pais. E se acontecesse? Talvez eu pensaria: “Não consigo mudar o que aconteceu, mas o que será que eu aprenderia com isso?” – se é que posso aprender tanto com a dor.

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A ligação

O tempo foi passando, eu fui crescendo e já não era mais um garotinho de 11 anos. Algumas coisas eu já entendia muito bem. Talvez o fato de eu conviver muito com adultos me tornou uma criança madura, se é que posso dizer isso. Até então, eu havia tido uma perda de alguém da família, aos 4 anos: a minha bisavó. Ela estava muito doente e, por isso, tinha colocado na minha cabeça de criança que Deus havia trazido ela para perto dele para cuidá-la. Não aguentava vê-la sofrendo tanto assim.

Meus pais buscavam falar comigo sobre perdas para que eu pudesse entender melhor o processo da vida. Era difícil entender como uma pessoa boa poderia “sumir para sempre”. Mas se tem uma coisa que aprendi ao longo da minha vida é que nem tudo é como queremos e que talvez existem acontecimentos que nunca vamos entender.

Em um dia qualquer, quando fazia sol, recebemos o telefonema da minha vó materna. Ela relatou que o vô não estava se sentindo bem e que precisava realizar uma consulta médica. Rapidamente minha mãe fez contato com suas outras irmãs para agendar uma consulta. Meu tio, que morava ao lado da casa do vô, o levou para o médico. Como minha mãe precisava estar na tornearia mecânica com meu pai, minha tia Mônica foi até o hospital para ter notícias sobre o vô. Ficamos preocupados. Meu vô já tinha um problema no coração.

Enquanto não recebíamos notícias, comecei a pensar nele. Brincalhão, engraçado e divertido. Acho que essas eram as principais características dele. Em grande parte da vida ele teve problemas com o excesso de bebida, o que chateava toda a família. Nunca foi agressivo, mas falava coisas desnecessárias. No entanto, quando ele descobriu que tinha uns problemas de saúde e que nunca mais poderia ingerir bebida alcoólica, tudo mudou para melhor. Parecia que o vô havia ficado mais “família”. Se importava com os netos, com as pessoas que estavam perto dele. Nos últimos anos tinha sido sempre incrível os momentos com ele.

Não demorou muito e recebemos uma ligação da minha tia. Ela relatou que o vô estava bem, mas que havia tido um princípio de infarto e que, por isso, necessitava ficar mais um tempo no hospital em observação. Ficamos aliviados ao saber que ele estava bem. Era só questão de tempo para ele voltar para a casa.

Passamos a noite mais tranquilos, mas com o coração um pouco apertado por termos alguém da família no hospital. Ao longo do dia seguinte, mais pessoas da família foram vê-lo na UTI. Ele conversava e estava bem, de fato. Eu não cheguei a ir visitá-lo. Mais um dia passou e o vô seguia em observação no hospital. No dia seguinte, minha outra tia recebeu a ligação de uma profissional de saúde do hospital pedindo para que fosse até o local. Ela foi com a certeza de que fosse o dia em que vô receberia alta, já que no dia anterior estava tão bem.

No local, a profissional relatou o quadro do paciente e disse que infelizmente ele teve mais de uma parada cardíaca e veio a falecer. Era dezembro e meu vô descansou para sempre.

Me doeu e foi mais difícil de entender. Ele não estava tão doente. Por que dessa vez Deus queria meu vô para perto dele?

Dias depois, eu soube que no hospital havia um enfermeiro que cuidava do vô e ele comentou que era muito parecido comigo: bonito e simpático. Fiquei feliz, porque ele havia lembrado de mim.

Meu vô teve suas falhas ao longo da caminhada, mas, nos últimos anos de vida, costumo dizer que ele consertou tudo o que estava com problema. Foi um bom pai, marido, bom vô e uma pessoa humana. Às vezes, penso que a gente não pode apagar os erros que cometeu, mas sempre é possível aprender com eles, para que, no fim da vida, a gente sempre possa fazer as pessoas nos levarem da melhor forma no coração e na memória.

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Insegurança

 

Eu não entendia muita coisa sobre criminalidade. Só sei que, pelo que eu assistia na televisão, as pessoas se sentiam cada vez menos seguras. Mas aquela realidade de insegurança, crimes e mortes parecia muito distante de mim. Mesmo assim, quando eu rezava, pedia para que Papai do Céu sempre protegesse a minha família. Já havia perdido meu vô recentemente e não queria que mais alguém especial partisse para sempre.

Em um dia, como de costume, cheguei da escola e fui abraçar meus pais na tornearia mecânica. Quando me aproximei, senti os dois muito preocupados. Logo me abraçaram apertado de um jeito que nunca haviam abraçado.

– Que bom que você está bem, meu filho!

Não entendi e, então, logo perguntei:

– O que aconteceu?

– Fomos assaltados, meu filho. – Respondeu o meu pai.

– Como assim?

– Um homem chegou de moto, com um outro indivíduo na carona, e não tirou o capacete. Já achei estranho. Então apenas um deles veio ao meu encontro e me perguntou tudo o que eu fazia no local. Expliquei como funcionava o meu trabalho e sem conseguir terminar ele disse: “Então me passa a grana”. Fiquei sem reação e perguntei: “O que tu disse? Está de brincadeira né cara?” A resposta veio em seguida: “Não tô brincando. Isso é um assalto (fazendo menção de estar armado). Me dá o dinheiro”. Quando percebi que de fato era um assalto, então peguei um dinheiro que tínhamos no caixa e ele ainda levou o meu celular e da tua mãe. Sorte que tua mãe estava pendurando as roupas em casa e não estava junto. Os dois saíram e fugiram com a moto.

Fiquei imaginando a cena e só agradeci por nada ter acontecido com o meu pai. Então abracei ele apertado e, em seguida, minha mãe se aproximou.

Foi naquele momento que comecei a entender um pouco mais sobre o que era essa tal da insegurança que tanto as pessoas falavam na televisão.

Naquele mesmo dia, à noite, deitado na minha cama, direcionei os meus olhos para a janela e novamente olhei para as estrelas. Pensei para mim: a bisa e o vô estão lá em cima. Fiquei uns dois minutos sem pensar em nada. Então falei em voz alta:

– Por que Deus? Por que existe maldade? Por que existe criminalidade? Por que pessoas boas sofrem? Às vezes não te entendo, mas, mesmo assim, eu te amo!

Fechei meus olhos e logo peguei no sono.

 

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Aflição

Era um sábado de inverno e meu pai José amava o frio. Tinha o costume de fazer fogo no fogão a lenha. Mamãe não gostava muito, porque sempre dizia que dava sujeira. Mas quando a casa ficava quentinha, ela amava (risos).

Um dia quando eu estava sentado em frente ao meu notebook fazendo algumas pesquisas, meu pai trazia um cesto de lenha. Cuidadosamente ele ajeitava as lenhas e já preparava tudo para, à noite, fazer fogo na lareira.

Enquanto fazia esse serviço, ele disse:

– Sabe filho, o pai tá começando a ficar preocupado. Em março sofremos aquele assalto e nessa noite que passou percebi que foram furtados alguns equipamentos da tornearia mecânica. A gente não sabe o que fazer, porque nunca a criminalidade esteve tão perto da gente.

– Eu entendo, pai. Eu também nunca dava muita bola para essas coisas e vi que não estamos livres disso. Mas não vai acontecer nada.

Nunca vi meu pai aflito, sendo que estávamos todos ali. Apesar de tudo, sempre acreditei que éramos protegidos por Deus.

Pensei, também, que de fato é frustrante ver meus pais trabalhando tanto e terem suas coisas levadas por criminosos. Só quem batalha de verdade e luta pelos seus sonhos sabe que existem coisas que não têm preço, mas muito valor.

Apesar da aflição ter tomado conta dos nossos corações naquele momento, eu tinha fé de que isso iria passar e nada de ruim iria acontecer conosco. Desde sempre eu só pensava em aproveitar a vida nos mais diversos momentos e rezava para que ninguém mais da família virasse uma estrela tão logo assim.

Perdido em meus pensamentos, fiquei refletindo que se eu pudesse ter uma varinha mágica, mudaria tanta coisa neste mundo. Começaria devolvendo dignidade a algumas famílias, tiraria a maldade que existe e a dor nos corações. Também daria saúde a quem merece.

Balancei a cabeça e caí na realidade: isso nunca vai ser possível. Então perguntei a mim mesmo: se eu não posso mudar o mundo, o que eu posso fazer para que a minha vida tenha valor?

Quando terminei de pensar isso, meu pai se aproximou de mim, sem eu esperar, e disse: “Te amo, meu filho”.

Então pensei para mim que a resposta da minha pergunta seria simples: viver com amor!

——————————————

 

 

A criminalidade bateu na porta

Parecia mais um dia qualquer, mas não, não foi. Foi O dia 13 de julho. Saí de casa para ir para a escola e antes de sair de casa, como de costume, dei um abraço apertado em meu pai e na minha mãe. Eu sempre fazia isso quando saía de casa ou, até mesmo, quando ia dormir. Como era inverno, lembro até hoje da cena do meu pai pertinho do fogão que ele tinha na tornearia mecânica. Ele, com o seu boné, sorriso no rosto, me desejou uma boa aula.

Naquele dia aprendi conteúdos novos na escola. Eu adorava aprender e também ajudar os colegas que tinham alguma dificuldade nos estudos. Qual o problema de ajudarmos? A gente nunca sabe o dia de amanhã, não é mesmo? É, eu de fato não sabia.

Na volta para a casa o ônibus estragou e tivemos que esperar um outro veículo para irmos para casa. Em função do trânsito louco de São Paulo, demorávamos muito mais tempo para nos deslocarmos de um lugar até outro do que de fato precisaria.

Cheguei em casa quando já estava escuro e eu sabia que naquele dia não encontraria nem meu pai, nem minha mãe em casa. Minha mãe havia combinado de jogar carta na minha tia Sílvia, que morava bem perto de nós. Meu pai, no entanto, saiu da tornearia mecânica mais cedo para levar minha vó – mãe dele – ao hospital, pois ela precisava fazer alguns exames. Minha tia Mônica ficou um pouco a mais na tornearia já que tinha alguns serviços de escritório para fazer.

Mas, quando cheguei em casa, de fato, havia apenas eu. Coloquei minha mochila no canto do sofá, como era o costume, e fui tomar um banho. Estava muito frio e mais frio ainda, porque o fogo na lareira não estava aceso. Tomei meu banho e coloquei meu pijama e um roupão.

Não demorou muito para que eu escutasse uma movimentação de carro: meu pai estava chegando! Fiquei tão feliz ao ver que ele se aproximava. Estacionou o carro nos fundos da tornearia mecânica, ao lado da escada que dava acesso à nossa casa.

Naquele momento abri a porta da sacada de casa e ainda falei em voz alta: “o meu pai veio!” Quando ele já havia saído do carro e dava os primeiros passos na escada para entrar em casa, percebi que ele havia se abaixado, como se tivesse escutado alguma coisa. A partir daquele momento, tudo mudou para sempre. Em questão de segundos, vi três indivíduos saindo de trás das árvores que estavam nas proximidades. Todos eles encapuzados e dois deles apontavam uma arma para o meu herói. Meu pai ficou parado na escada e não se mexia. E eu só escutava daquelas três pessoas: “perdeu, perdeu, perdeu!”

Quando notei que de fato se tratava de um assalto, saí da sacada e fechei a porta de casa. Eu estava em estado de choque! Peguei o telefone com o intuito de pedir ajuda. Na hora, só pensei em ligar para a minha tia Mônica, que morava praticamente do lado da tornearia mecânica. Devido ao nervosismo, eu acabei discando errado o número de telefone e quem atendeu foi um outro conhecido. Eu só falei: “assalto, assalto! Aqui na tornearia”. E desliguei o telefone.

Notando que havia ligado para a pessoa errada, me concentrei e consegui discar o número correto para falar com minha tia Mônica. Quando ela atendeu, escutei um tiro. Então eu só disse: rápido, rápido, tia, fomos assaltados e o pai levou um tiro.

Por mais que eu tenha feito tudo isso, todos esses acontecimentos não levaram nem 2 minutos. Quando desliguei o telefone, escutei o barulho do carro saindo em uma velocidade muito rápida. Entendi que os criminosos haviam ido embora. Abri a porta da sacada novamente e olhei para a escada. Meu pai não estava mais na escada. Pensei para mim: não, não acredito que levaram meu pai José baleado. Ele não vai receber atendimento e pode morrer no caminho.

Olhei novamente para a escada e vi que meu pai estava deitado do lado da escada, com a barriga para baixo. Como estava escuro e ele vestia uma jaqueta preta, eu não tinha conseguido vê-lo. Desci rapidamente as escadas e, naquele momento, só estávamos eu e meu pai José. Olhei para a barriga dele e percebi que ele havia levado um tiro na barriga. Era um buraco muito pequeno e não sangrava nada no lado de fora. Pensei para mim: ao menos não foi na cabeça e nem no coração. E só dizia: “vai dar tudo certo pai, vai dar tudo certo!”

Saí um pouco dali e fui gritando até a casa da minha tia Mônica dizendo: “rápido, rápido, o pai levou um tiro e está lá deitado.”

Minha tia Mônica já havia ligado para o marido dela, que não estava em casa, mas que em poucos minutos apareceu desesperado, achando que algo havia acontecido com a filha dele, minha prima, e uma criança muito pequena na época.

Saí de perto da minha tia e voltei ao local onde meu pai estava deitado. Percebi que ele havia caminhado alguns metros para tentar sair do lado da escada. Mas ele seguia deitado no chão, sem forças, com os olhos fechados, salivando e cada vez mais branco. Quando estava ali, ao lado dele, não demorou muito para que meu tio chegasse, estacionasse o carro ali do lado com a intenção de levá-lo imediatamente ao hospital. Segundos depois escutei gritos de desespero:

– Joséééé! Joséééééé! – Era a minha mãe que já havia sido avisada sobre o que aconteceu e já estava lá na companhia do Adelmo, o pai do meu melhor amigo. Adelmo estava no mesmo local onde minha mãe estava jogando carta e para não deixá-la sozinha, resolveu ir junto.

Meu tio tentou levantar sozinho o meu pai, mas ele era pesado e estava difícil. Então Adelmo auxiliou. Eu só escutava do meu tio:

– Vamos José, força! Força José!

E eu só via o meu pai salivando.

Conseguiram colocá-lo no carro e os três foram rumo ao hospital. Novamente estava eu, sozinho. Foi apenas ali que me lembrei de ligar para a polícia militar. Quem atendeu foi um policial que era bastante amigo do meu pai. Não sei como, mas em poucos minutos ele já estava lá.

Foi tudo tão rápido que em questão de pouco tempo muitas pessoas já estavam no nosso pátio. Subi para a casa e lá fiquei. Minha tia Mônica estava comigo naquele momento e também o policial amigo do meu pai. Começaram a olhar as imagens do assalto e eu percebi que meu pai sequer reagiu. Ele estava parado na escada, com dois indivíduos na frente dele e um segurando o pescoço dele por trás. Apenas em um momento ele teve um movimento que talvez fez com que achassem que iria reagir. Foi o momento em que ele levou o tiro. Imediatamente, depois disso, eles pegaram o carro que meu pai havia deixado estacionado e fugiram.

Eu sei que ele ficou parado firme naquela escada, porque sabia que eu estava em casa. Ele não deixaria jamais aqueles criminosos terem contato comigo. Por isso a resistência em sair dali.

Estávamos eu, minha tia e o policial na casa quando recebemos a ligação do meu tio. Foi minha tia Mônica que atendeu. Só escutei ela dizendo: “Não acredito, não acredito!”

Ela desligou o telefone, olhou em minha direção. Se aproximou e colocou as duas mãos sobre os meus braços e disse:

– Antônio, eu não sei nem como te dizer, mas teu pai não resistiu.

Meu mundo caiu naquele momento. Então falei: “Mas é verdade? Será que eles não se enganaram? Liga de novo para o hospital para ver se não foi engano”.

Naquele momento, o policial, que era amigo do meu pai, me abraçou apertado e estava muito abalado, apesar de estar acostumado com tantas desgraças na profissão. Mas ele havia perdido um AMIGO! Não era uma pessoa comum.

Fui para o quarto e me sentei na cama. Então ele foi atrás, olhou nos meus olhos e disse:

– Antônio, tu precisa ser forte e ser forte pela tua mãe!

Eu não conseguia chorar nada naquele momento. Minha tia, que também estava em estado de choque, ligou novamente para o hospital para ter certeza sobre a partida do meu pai. Mas sim, era tudo verdade!

Ela também entrou no quarto e pediu para que eu separasse o terno que estava no armário. Era a roupa que ele usaria no velório.

Separei a roupa e fomos até o hospital. Foi a pior noite da minha vida. Cheguei na emergência do hospital e havia no local muitas pessoas queridas. Minha mãe veio me abraçar. Estava acabada. Só me falou:

– Você quer ver ele lá deitado com os aparelhos? Fizeram de tudo e não deu!

Só disse:

– Não, eu não quero ver ele assim.

Sabe, realmente não queria carregar comigo essa imagem. Por que não poderia carregar imagens de momentos bons? No que aquela imagem iria melhorar a minha vida?

Alcancei as roupas dele para a minha mãe e continuava não conseguindo chorar. Só pensava: “isso é um sonho? Eu rezava tanto e pedia tanta proteção para Deus. Por que isso aconteceu?” Confesso que por alguns minutos me revoltei contra Deus: “Do que adianta sermos pessoas boas neste mundo se o mal vence igual?”

Nas roupas que o meu pai usava, ainda estava o celular e a carteira dele, que não foram levados pelos criminosos. Foi um latrocínio – roubo com morte. Levaram o carro e a vida do meu pai. Além da carteira e do celular, minha mãe achou dois pirulitos. Tenho certeza de que um era para mim e outro para ela. Meu pai sempre ia nos lugares e nunca esquecia da gente. Sempre que podia, trazia alguma coisa para casa. Nem que fosse uma bala. Assim ele fez, até os últimos minutos da vida dele.

Os dias seguintes a esse episódio foram terríveis. Investigação, muitas matérias nos veículos de comunicação, pessoas curiosas querendo saber como aconteceu e o que eu vi – sem se preocupar de fato com nossos sentimentos.

Tudo iria mudar completamente. E a tornearia mecânica? Como ficaria?

O carro roubado foi deixado alguns poucos quilômetros de distância da nossa casa. Do lado do carro, a chave. Talvez a intenção dos criminosos não fosse matar meu pai, mas fazer alguma coisa comigo, me usando como refém. Ou, ainda, acharam que tínhamos um cofre em casa. O que era mentira. Nunca tivemos muito dinheiro. Até hoje não sei ao certo o que eles queriam. Mas eu tenho total certeza de que meu pai protegeu a minha vida até onde conseguiu. E ele conseguiu! Ele foi e sempre será meu herói.

O tempo passou e o policial, amigo do meu pai, também ficou em choque. Não muito tempo depois disso, conseguiu se aposentar. Ele estava cansado e sentiu muito pela perda do meu pai. Quando meu pai vivia, muitas foram as vezes que ele parou na tornearia mecânica para conversar com meu pai. Depois do falecimento, ele contou que não conseguia nem olhar para a tornearia, porque doía ver que meu pai não estava mais lá. Mas sabe, a vida tem dessas coisas. Ele foi um ótimo amigo e só por ter sido alguém assim, já fez a passagem dele na vida do meu pai valer a pena.

 

Não apequene a vida

Os dias se passaram e não foi muito fácil para a minha mãe e minha tia tocarem o negócio. Elas foram se virando no que dava, mas os serviços do empreendimento em si não eram algo que elas dominavam. Não demorou muito e resolveram vendê-lo. Minha mãe já estava se aposentando e as duas estavam muito cansadas da correria.

Após conseguirem vender o negócio do meu pai, passei a refletir ainda mais sobre o quanto pessoas e coisas em nossas vidas são passageiras. A gente nunca sabe o que vai durar uma vida inteira ou o que vai permanecer com a gente apenas alguns anos. Pessoas vêm e vão. Coisas compramos e vendemos. Construímos e nos desfazemos. Tudo se movimenta de alguma forma.

É justamente por tudo mudar que não podemos apequenar a nossa vida. Mas o que significa apequená-la?  É quando somos mesquinhos, quando preferimos alimentar o ódio e investir no orgulho. É quando só damos importância ao que tem preço e não ao que tem valor. Quando também não reconhecemos os nossos próprios valores e importância neste mundo.

É difícil seguir a vida quando pessoas importantes viram estrelas, mas isso não quer dizer que tudo perde o sentido. A única coisa que temos certeza é de que um dia iremos partir. O fato de algumas pessoas partirem mais cedo ou até mesmo de forma injusta, muitas vezes revolta, mas eu sempre, sempre mesmo, acreditei que deve existir alguma explicação. A vida não pode ser tão injusta com quem é do bem. Prefiro pensar que existe um porquê. Senão, viver fica difícil.

Minha mãe seguiu a caminhada, apesar de tamanha dor no coração com a partida do meu pai. Ela perdeu um parceiro de uma vida toda e eu perdi o melhor pai que eu poderia ter. Não foi fácil para ninguém, mas carrego muito do meu pai nas minhas atitudes e, por isso, acredito que ele segue tão vivo no meu coração.

Você que está lendo este livro agora, com certeza deve ter pessoas importantes na sua vida. Sejam elas seus pais ou não, deve doer só de pensar em não tê-las mais com você, não é mesmo? Não quero lhe falar aquelas coisas clichês de que precisamos valorizar as pessoas em vida. Mas se eu puder lhe dar conselhos, seria: aproveite todos os momentos que você pode com essas pessoas. Diga também o que sente e procure aprender tudo de bom que elas têm a ensinar.

Tenho certeza de que no momento em que elas se forem, você vai ficar com o coração leve por saber que amou da forma como poderia amar, disse o que poderia dizer e por aprender muito com elas, carrega tanto dessas pessoas na sua alma e nas suas atitudes! Seja você também uma pessoa incrível, para sempre ser lembrada.

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O que de nós fica?

Eu cresci. Não sou mais aquele garotinho e a criança que brincava e não via a maldade que existe no mundo.

Eu cresci, me formei em Enfermagem e sempre busquei dar orgulho e amor à minha mãe, como forma de dar forças para ela seguir a caminhada.

Na maioria das vezes, quando algo bom acontece na minha vida, por alguns segundos ainda penso em contar as novidades para o meu pai. Quando me dou conta de que ele não está fisicamente comigo, conto tudo através das minhas orações.

Toda a vez que visito o cemitério onde meu pai está enterrado, reflito em meio àqueles tantos túmulos. Alguns são mais novos por serem de pessoas que faleceram há pouco tempo, outros nem é possível ler o que está na lápide. Não foi uma nem duas vezes que olhei para os túmulos e refleti sobre o verdadeiro sentido da vida.

Todos nós partimos e, independente da riqueza, da profissão ou do status, apodrecemos. Difícil aceitar isso, mas é a verdade.  Então o que de nós fica? Aquilo que fomos, as marcas que deixamos, o que ensinamos, o bem que fizemos, as almas que tocamos. Enquanto formos lembrados, sempre estaremos vivos de alguma forma, mas nos corações e na memória das pessoas.

Com este livro, não quero mudar a sua essência, mas fazer você refletir sobre a pessoa que é e vem se tornando, sobre as escolhas que vem fazendo e que podem mudar por completo o seu rumo.

Qual é o sentido que você está dando à sua vida se tudo pode mudar tão rápido, como aconteceu com meu pai? Qual o sentido que você está dando à sua vida se sabe que um dia não estará mais aqui?

Apesar de tudo o que aconteceu com a minha família e apesar da dor que foi causada pela criminalidade, não alimentei o ódio no meu coração. Por que isso? Talvez porque meu pai me ensinou a cultivar o amor, a entender que cada pessoa tem o seu tempo para aprender a ser um ser humano melhor. E talvez nunca seja. Apesar do mal ter levado o meu pai, em vida ele me ensinou que o bem vence. De alguma forma, em algum lugar, em algum momento, ele vence!

Eu cresci e se hoje tem algo que eu levo muito a sério são os momentos. Os momentos podem ser eternizados para sempre. Quando paro e penso no meu pai, do que eu me lembro? Das brincadeiras que ele fazia comigo, mesmo quando estava cansado e sem vontade de brincar. Lembro das histórias que ele lia, do que ele me ensinava através do que acontecia comigo. Eu não lembro das roupas que ele usava, se estava descabelado ou penteado, se tinha dinheiro na carteira. Eu lembro do que ele ERA em essência!

E você, como tem sido para as pessoas que convivem contigo?

No fim da sua vida, só vão lembrar mesmo do que você foi de verdade! E se sentirem a sua falta é porque saudade é o amor que fica!

——————————–

Uma mensagem para você!

Talvez, em algum momento da sua vida, você tenha perdido alguém importante na sua caminhada, ou até mesmo, um animalzinho de estimação que também tem muito valor.

Pode ser que você não tenha perdido um pai, mas um amigo, uma mãe, um filho, os avós ou outra pessoa especial. Mas acredito que, de alguma forma, as palavras deste livro tenham feito sentido para você ou talvez algum dia farão.

Por mais espiritualizados que sejamos, a verdade é que nunca estamos preparados para perder pessoas e, até mesmo, para perdas em geral.

Dói perder. Mas você já se perguntou o quanto a perda te faz crescer como ser humano, te faz enxergar a vida e o seu sentido de uma forma diferente?

Só quero que saiba que você que está lendo este livro agora é importante. Acredite! Alguém sempre será importante para pelo menos um outro alguém. Por esse motivo, não perca o brilho nos olhos jamais. Não deixe de investir em tudo aquilo que faz seu coração pulsar mais forte.

Apenas SEJA! Seja humano, seja gentil, seja honesto, seja empático (a), seja uma pessoa que vale a pena conhecer!

Apesar de ter crescido, amadurecido e me tornado um adulto, carrego dentro de mim o mesmo amor e a mesma saudade desde quando meu pai partiu. Talvez ali esteja um dos maiores valores da vida: marcar corações.

O tempo pode passar, mas talvez, de alguma forma, eu seja sempre aquele garotinho e meu pai aquele grande e para sempre herói!

 

Sobre a autora

Kethlin Nadine Meurer, 28 anos, nasceu no dia 14 de fevereiro de 1996.

É jornalista, formada pela Universidade de Santa Cruz do Sul.  Trabalha há cerca de nove anos na área da comunicação, tendo experiência em marketing e também em veículo de comunicação.

Natural de Santa Cruz do Sul, município do Rio Grande do Sul, ainda é autora do livro de crônicas “Somos todos gigantes”. O livro traz reflexões sobre a vida e mostra que cada pessoa, independente do tamanho, aparência ou situação financeira, pode ser gigante como ser humano.

 

FRASE DO LIVRO PARA COLOCAR NO MARCADOR DE PÁGINA:

“Queria que os meus sonhos fossem como estrelas. Mesmo distantes de se concretizarem, deveriam sempre brilhar, principalmente dentro do meu coração.”

Trecho do livro “Meu pai é um herói”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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